“Alcy Caluamba e os cães da metrópole” – Johnson Pedro

Aquando do início da realização de exames de ensino secundário no território moçambicano, os estudantes da 10ª Classe foram surpreendidos pela presença do Alcy Caluamba, influenciador digital e “humorista”, no no exame de Língua Portuguesa.
A sua chegada foi através da adaptação da entrevista por ele concedida ao órgão DW África, e em resumo apresenta-se no exame a definição do jovem, desafiando os estudantes a leitura, interpretação e posteriormente responderem às questões.
Em poucas horas, o marco tornou-se num dos mais populares, chegando a ofuscar outros pontos da agenda, daquela segunda-feira, como é o caso do Aeroporto Filipe Nyusi e dos 13.800 Meticais a pagar para ida e volta num circuito de 200 km (Maputo para Gaza).
Entre o festejo do Alcy, adoração e gostos dos seus seguidores, surgiu o elenco que não deixa nada passar, o elenco da opinião contrária, os cães da metrópole, raivosos e como sempre com um latido armazenado. Para eles, não é justo levar se Alcy para uma sala de exame, devia ser Paulina Chiziane porque ganhou o Prémio Camões 2021, devia ser Mia Couto, Malangatana e mais nomes da cultura e arte moçambicanas, pois segundo os cães da metrópole, Alcy não é conhecido por todos e isso possivelmente resulte em problemas na resolução do exame.
Verdade seja dita, a chegada do Alcy às salas de exame somente veio mostrar o quão estamos dotados de energias destrutivas, despreparados para o triunfo de um conterrâneo, e os problemas de leitura e interpretação existentes na metrópole ou a pressa em querer mostrar que de algo sabemos, às vezes, até mais que o Sócrates, pois num cenário em que se tem um texto de gênero jornalístico (entrevista) respondendo às questões descritivas do indivíduo não se justifica tamanho barulho.
Alcy não é conhecido por todos, quais são esses todos? Estamos a falar de alunos da décima classe? Aqueles que boa parte são uma geração digital, temos mesmo certeza de que não conhecem o Alcy? Talvez sim, mas se não o conheciam já o conhecem, pois o texto foi claro nesse aspecto informando aos estudantes quem é, o que fez, como, quando e porquê?
Se temos certeza que o Alcy não é conhecido, o que nos garante que os estudantes estão a par do Prémio Camões atribuído à Paulina Chiziane? Porque saiu na TV, na rádio? E o Alcy nunca foi para essas estações de comunicação?
Alcy faz parte da cultura geral
Amigos, precisamos compreender que a cultura geral não é feita somente de literatura ou de um número limitado de artistas. A cultura geral e a própria arte são sobre aquilo que um povo consome, são as manifestações artísticas que acontecem seja no passado ou presente.
Precisamos de dar a conhecer novas vozes, vozes que se ligam com o cotidiano actual, e Alcy é uma dessas vozes, voz que pode mostrar aos putos que é possível lutar por uma formação ao mesmo tempo que as redes sociais possam servir de renda para pagar as fichas e, assumindo que o país é corrupto, pagar o professor umas notas e assim aumentar a nota na pauta.
Democratizemos a arte, pois ela não é somente de Paulina, Mia ou Malangatana, é também do Alcy, Sebastião Coana, Hot Blaze, Gilberto Mendes e mais nomes. vamos aprender a aplaudir para novas estrelas para que ganhem coragem e no mostrem os caminhos por percorrer.
A propósito de “devia ser Paulina Chiziane…”, quanto de nós leu o livro que ganhou o prémio Camões? Quanto de nós conhece a última obra do Mia Couto? Poucos, e já conhecemos o motivo: o livro está caro. Agora, imagine os estudantes. Seus cães da metrópole!
Bem haja o MINEDH e os professores que mais próximos estão do que é consumido pelos estudantes e buscam formas de fazer disso um objecto de estudo.
-Hitavonana